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Imagem da Capa: A Luz que entra a Pique pela velha chaminé, 1960

Julho - Setembro 2006

Carlos Calvet 22ª Exposição Galeria dos Paços do Concelho

As fotografias de Carlos Calvet atravessam a segunda metade do século XX, entram no século da imagem-quadro e da digitalização com o mesmo espírito de deambulação com que foram desenvolvidas. (...)

As fotografias de Carlos Calvet atravessam a segunda metade do século XX, entram no século da imagem-quadro e da digitalização com o mesmo espírito de deambulação com que foram desenvolvidas. Mantêm de ideal surrealista a eleição do fragmento e, aqui e ali, a pequena ironia desta doença de viver.

Maria do Carmo Serén

(Centro Português de Fotografia, 2005)

 

 

...É deambulando que se fotografa e só a fragmentos pode tirar-se o retrato.

Assim faz, pois, duplamente, Carlos Calvet, cujo mundo foi ganhando um dinamismo fatal, em cada quadro da sua pintura. Assim o pintor e o fotógrafo que deixou de ser por já não valer a pena o gesto ou o carregar com a máquina ao deambulante que tem quadros demais para pintar para o tempo que todos temos de vida. Ainda há pouco o Fernando Lemos me dizia, fotógrafo também que foi, e pintor que é, sendo homem da mesma nossa idade... Não é uma questão de fases nem tanto de circunstâncias, mas de instrumentos que o artista queira usar, em magias de correspondências universais, sempre.

… Sua Majestade Britânica veio a Portugal em 1957, foi a S. Carlos, e vice-versa — e as anedotas que se contaram então foram tão lisboetas como estas pessoas fotografadas a eito, vindo à beira rio ver a régia chegada e olhando, como sempre lusitanamente, para coisa nenhuma. E eu sustento que não há série fotográfica mais sociológica do que esta, do Calvet, contando pessoa a pessoa, tristes todas e ainda de chapéu na cabeça e apontando — que dos barcos engalanados, à míngua de D. Sebastião vinha D. Isabel! Seja de frente seja de costas, há sempre lisboetas para ver o que não haja...

E lá estão eles, também dois minutos, olhando para os programas de 5.°feira, sábado e domingo do “Animatógrafo do Rossio”, e um “ almeida” com eles, “Espada Sarraceno”, “Garras de Mulher”, “Aventuras de Marco Polo” — bons tempos de cinema para todas, entre volutas fitomórficas de Arte Nova!... Porque nas suas casas é o que é; este fogão velho de cano ferrugento, uma cabeça de fogareiro ao lado de uma garrafa suja em cima, tudo recortado sobre o azulejo quebradiço da parede — sob uma luz irreal que o fotógrafo viu cair de cima, metafisicamente, como na sua pintura acontece.

E também de interior não conheço outra pintura assim, com tal tristeza ao serviço da gente do lado de fora fotografada.

José-Augusto França, 2006

 

 

 

OLHAR E VER

OLHAR É FÁCIL/VER É MAIS DIFÍCIL

O problema é que fico sempre com a sensação de não ter visto tudo aquilo que merecia sê-lo.

Outros verão mais...

Pelos meus 12 anos tive uma pequena Kodak preta que dava “excelentes” (a meus olhos) fotografias. Um dia caiu no chão e fez uma pequena fenda na tampa. Daí em diante, a luz entrava por dois orifícios, ordeiramente pela objetiva, anarquicamente pela fenda. Isso dava bizarras fatos com fantasmas brancos desfocados voando por cima do assunto. Não era desinteressante mas também não era exatamente o que estava nos meus planos. Passaram-se alguns anos e entrou em cena uma modesta Agfa Clac, de 300 escudos, cuja objetiva aceitável me deu algumas firmes alegrias. Embora por pouco tempo. Eu começava a ficar excitado, queria mais! E de súbito, um dia, experimentei uma Leica que me tinham emprestado. Nobilíssima Visione! E querem crer? Logo a seguir aparece-me na montra do Penaguião da Rua da Misericórdia uma Leica em 2.°mão por 3 contos, quase a totalidade do meu ordenado na época, ano da graça de 1956. Não resisti mais de 24 horas. O próprio Penaguião me garantiu que estava em excelente estado, era pechincha e trazia a melhor objetiva do mundo, a Elmar 50 — ainda hoje trabalha perfeitamente.

Comecei a disparar em todas as direções, para tudo que se mexia ou me aparecia pela frente. Os assuntos caíam como tordos! Neste livrinho se pode ver alguns exemplos dessa caçada. E para culminar a minha felicidade, havia o Paixão a fazer-me as ampliações. Que maravilha! Como eu gostava daquele retângulo 2x3, inteirinho, compô-lo logo ao disparar, nada de cortes! Não admira, duas vezes três dá seis, o 1.° número perfeito.

Bem, tudo passa, agora já quase só “fotografo” com os olhos. Há tanto assunto por todo o lado — mas tenho preguiça de andar a calcorrear quilómetros com aquele peso às costas. E não tenho tempo. Ficam as “fotos” na memória até que se desvaneçam...

Hoje a pintura, grata atividade que já dura há 60 anos, tomou conta da minha vida, do meu tempo, da minha mente e dos pingos de tinta na minha roupa. Mas tal não significa que tenha desistido de fotografar.

A Ver vamos...

Carlos Calvet / Lisboa, 5 de Dezembro de 2004

 

 

Catálogo

 

1. A mulher de branco - Lisboa, 1956, 50x33,3cm

2. Carris - Lisboa, 1956, 50x33,3cm

3. Mercado de Cascais – 1956, 50 x 33,3 cm

4. Velhas máquinas em Campolide - Lisboa, 1956, 50 x 33,3 cm

5. Cinema Rossio – Lisboa, 1956, 50 x 33,3 cm

6. Desembarque de Isabel II - Cena de multidão – Lisboa, 1957, 50 x 33,3 cm

7. Desembarque de Isabel II - Cena de multidão – Lisboa, 1957, 50 x 33,3 cm

8. Desembarque de Isabel II - Cena de multidão - Lisboa, 1957, 50 x 33,3 cm

9. Desembarque de Isabel II - Cena de multidão – Lisboa, 1957,50 x 33,3 cm

10. Destroço - Algés, 1958, 50 x 33,3 cm

11. Óbidos extramuros – 1959, 50x33,3cm

12. Óbidos intramuros – 1960, 50x33,3cm

13. As grandes letras - Lisboa, 1959, 50 x 33,3 cm

14. As duas ciganitas - Lisboa, 1960, 50 x 33,3 cm

15. A luz entra a pique pela velha chaminé – 1960, 50 x 33,3 cm

16. Mar invernoso - Ericeira, 1960, 50 x 33,3 cm

17. Mar ameaçador - Ericeira, 1960, 50 x 33,3 cm

18. A cruz de mar - Ericeira, 1960, 50 x 33,3 cm

19. No cacilheiro - Lisboa, 1970, 50 x 33,3 cm

20. Multidão - Lisboa, 1970 – 50 x 33,3 cm

 

O ARTISTA E A OBRA

Carlos Calvet nasceu em Lisboa em 1928, é arquiteto pela Escola Superior de Belas Artes de Lisboa, e expõe pintura desde 1947.

A Galeria dos Paços do Concelho consagrou-lhe a sua 15.ª exposição em Outubro de 2004, inteiramente composta por pinturas, em relação com a obra que figura no Núcleo de Arte Contemporânea. No catálogo dessa exposição se deram as indicações bio-bibliográficas sobre a obra geral do artista cuja atividade fotográfica se manifestou até hoje em nove exposições em Lisboa (1989, 1990, 1992) no Porto (1999) e em exposições coletivas no Musée de la Photographie, Charleroi, Antuérpia (1991, no quadro da Europalia 91), de “Fotografia Portuguesa 1854-1997”, na Frankfurter Kunstverein, 1997, de “Portugal se asoma al Mediterrâneo”, Guardamar, Espanha, 2000, na “Coleccion del Centro Português de Fotografia”. Una selección, Fundació Foto Colectania, Barcelona.

O volume “Carlos Calvet” foi editado pelo Centro Português de Fotografia, Porto, 2004, com prefácio de Maria do Carmo Serén.

Carlos Calvet realizou ainda uma obra cinematográfica, com os títulos “Veneza 1959” (1960), “Filme Experimental” (1963), “Estudo de camioneta abandonada” (1963), momentos da vida do poeta” (1964), “Um dia no Guincho com Ernesto” (1969). Os cinco filmes foram apresentados na primeira sessão do projeto Slow-Motion, organização Aer Attack e Miguel Wandschneider, na ESTGAD, Caldas da Rainha, Maio 2000.

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