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Imagem da Capa: Leão, 1987-2005

Outubro - Dezembro 2010

Cruz- Filipe 39ª Exposição Galeria dos Paços do Concelho

...África, África, quem a tem chama-lhe sua, como pode, sabe ou lembra – ou fotografa. (...)

ÁFRICA, ÁFRICA...

...África, África, quem a tem chama-lhe sua, como pode, sabe ou lembra – ou fotografa.

Eu tive dela uma experiência dramática, colonial de há meio século – que me acusaram, politicamente, de ser “povoada por gente infeliz, torpe, vencida ou degradada”. Que era, que era, e por isso, na História, afinal se perdeu...

Cruz-Filipe tem uma experiência de caçador de imagens, atento às formas e às cores, e ao espanto delas que, por temperamento, se serena na sua visão. Estética, diga-se, ou mesmo esteticista, de quem inventou os estranhos e subtis diálogos entre quadros que vêm de Florença ou de Veneza, em delicadeza de perfis ou luxos de vestuário; e depois pintou mares e ondas desencadeadas explodindo, sem desculpas de gente, nisso submergindo os cenários que inventara em teatro de ópera...

E agora passa dos mares às terras, e das gentis gentes aos animais distantes, feras ou não feras, com patas e garras ou asas e plumas, que as povoam – como flamingos tão rosados que se diriam irreais.

Ou como, como – como o elefante que dá capa ao seu álbum. Um elefante de pormenor – que pequeno é o olho que se enterra na massa rugosa da pele, vivo e estúpido...

Fez muito bem o Saramago em achar assim o Salomão do rei D. João III, no seu terror de ser levado em viagem entre poderosas cortes de um continente alheio!

Mas, elefante por elefante – de trato ou carrego, guerra ou caça, ou de condecoração (que há ou houve, Branco, dada ao duque de Ávila...), qualquer que seja, há que lembrar o do Vasco Santana na Canção de Lisboa. Que “elefantes há muitos, ó palerma!” (Transponho dos chapéus, para melhor adequação, mas a partir do elefante auscultado). E elefantes vindicativos há muitos também, que despejam a tromba de água sobre os espertalhões que lhe derem moeda falsa; euro seria hoje...

Uma fotografia genial, em seu enquadramento, leva a tudo – geografia, anatomia, história, simbologia, psicologia zoológica, etc., etc.

... Que mais dizer desta paciente e sensível, serena e inventiva demanda de uma África ao mesmo tempo imaginária e real, turismos à parte, em que o pintor Ricardo Cruz Filipe se embarcou, de avião?

José-Augusto França

 

 

 

“Revelar” é o verbo que me ocorre quando contemplo as fotografias de Cruz-Filipe. Os animais não são objetos que descortinamos. Eles “aparecem”. Ou como se diz aqui, em Moçambique: eles dão aparecimento. Significa que os animais são donos da própria visibilidade e o simples ato de os descortinarmos não depende tanto das leis físicas, mas de uma indecifrável magia, de uma cumplicidade que desafia a lógica.

Cruz-Filipe não “viu” os animais que fotografou. Ele fê-los aparecer, num momento em que eles já não eram apenas um objeto fotográfico. Há, pois, nestas imagens o diálogo de um pintor que sabe que na fotografia, como na tela, nada está concluído.

O retrato não é um objeto mas uma troca silenciosa de afetos, falas de sombras, de cores e luzes. Todos estes bichos só se tornam visíveis porque eles autorizaram que os inventássemos, redesenhados numa outra natureza. Não olhamos: trocamo-nos, almas acendidas, visíveis pelo mágico toque de um construtor de beleza.

Mia Couto

 

 

 

Os primeiros animais vivos a entrar na história da fotografia foram o hipopótamo fotografado em 1852 no Jardim Zoológico de Londres, em Regent’s Park, por Juan Carlos de Borbón, Conde de Montizón (1822-1887), e o crocodilo sorridente apanhado, em 1857, na margem arenosa do Nilo, por Francis Frith (1822-1898). São ambos animais de grande inércia: um por virtude do peso, o outro por causa do sangue frio e metabolismo lento (precisa de se aquecer ao Sol). São ambos, por sinal, animais africanos (...)

Há uma estética da National Geographic (como há uma estética da World Press Photo), que favorece o pôr-do-sol, as silhuetas na savana. O close-up com teleobjetiva. Não há que ter vergonha do belo: grandes fotógrafos como Sam Abell (n. 1945), David Doubilet (n. 1946), Steve McCurry (n. 1950), etc., trabalham para a National Geographic. Os espaços abertos de África são irresistíveis. Para o europeu, é um paraíso reclamado onde se pode evitar o pecado original. De acordo com a velha máxima latina, “Ex Africa semper aliquid novi” (De África vem sempre algo de novo) – por exemplo a singularidade literária de Izak Dinesen (1885-1962), cujo Out of Africa (1937) marcou gerações. Fotógrafos como Peter Beard (n. 1938) – que privou com Dinesen – e Dan Eldon (1970-1993) fizeram de África um modo de vida e transformaram as suas obras num diário que é também um manifesto conservacionista (...)

Cruz-Filipe pensa fotograficamente a sua pintura – no conteúdo e nas associações dos fragmentos das suas “paisagens múltiplas” – mas a sua fotografia é salutarmente direta, despida de artifícios ou tiques artísticos (...)

A visão de Cruz-Filipe é essencialmente pacífica e nostálgica – e por isso nos prende (...)

Nas fotografias de Cruz-Filipe, não há a mínima intenção de antropomorfizar os animais (exceto, talvez, no bocejo leonino ou no close-up sobre o olho curioso do elefante). O animal é sempre o “outro”, não um de nós (...).

Jorge Calado

 

 

 

CATÁLOGO

 

1. Que ninguém diga, e diga-o para vossa vergonha, que tudo aqui era beleza até à vossa vinda

31 x 46 cm

2. Flamingos Rosa, 31 x 46 cm

3. Cotovia Africana, 40 x 61 cm

4. Abibe Africano, 40 x 61 cm

5. Elefante Africano, 40 x 61 cm

6. Papa-moscas, 31 x 46 cm

7. Leopardo, 40 x 61 cm

8. Leoa, 40 x 61 cm

9. Topi, 31 x 46 cm

10. Jabiru, 31 x 46 cm

11. Leoa, 40 x 61 cm

12. Búfalo do Cabo, 40 x 61 cm

13. Zebra de Burchell, 40 x 61 cm

14. Babuíno, 40 x 61 cm

15. Elefante Africano, 40 x 61 cm

16. Guarda-Rios de Cabeça Cinzenta, 31 x 46 cm

17. Girafa Masai e Babuíno, 31 x 46 cm

18. Pombo-Malhado, 31 x 46 cm

19. Abutre de Rüppel, 31 x 46 cm

20. Pelicano Branco, 40 x 61 cm

21. Hiena Mosqueada, 40 x 61 cm

22. Elefante Africano, 40 x 61 cm

23. Elefante Africano, 40 x 61 cm

24. Dik-Dik de Kirk, 40 x 61 cm

25. Impala, 40 x 61 cm

26. Chita, 40 x 61 cm

28. Hipopótamo, 40 x 61 cm

29. Ganso do Egipto, 40 x 61 cm

30. Hipopótamo, 40 x 61 cm

31. Cercopiteco, 40 x 61 cm

32. Girafa Reticulada, 40 x 61 cm

33. Rinoceronte Branco e Rinoceronte Negro, 31 x 46 cm

34. Leão, 40 x 61 cm

35. Elefante Africano, 40 x 61 cm

36. Reedbuck-da-Montanha, 31 x 46 cm

37. Ganso do Egipto e Graça Nocturna, 31 x 46 cm

38. Serpentário ou Secretário, 40 x 61 cm

39. “Esta terra não vos foi dada pelos vossos pais, foi-vos emprestada pelos vossos filhos”

105 x 70 cm

27. Rinoceronte Branco, 40 x 61 cm

40. “Bichos”, Placa 40 x 61 cm

 

A Câmara Municipal de Tomar agradece a colaboração amavelmente prestada pela artista, bem como pela DCM da Caixa Geral de Depósito/ Mecenas da Cultura, pela Culturgest e pela Assírio & Alvim.

 

 

 

 

O artista e a obra

 

Ricardo José Minotti da Cruz Filipe nasceu em Lisboa, em 1934.

 

É licenciado em engenharia pelo Instituto Superior Técnico, onde foi professor-assistente de 1958 a 1968. Dedicou toda a sua vida profissional ao sector da eletricidade, tendo-se especializado em estudos de gestão e de planeamento.

 

Pintor autodidata desde 1955, realizou a sua primeira exposição individual em 1957, na Galeria Pórtico, em Lisboa.

 

Em 1970, na Galeria 111 (Lisboa), expôs, pela primeira vez, pintura sobre as telas fotossensíveis, que a partir daí caracterizaria a sua obra.

 

Participou em diversas exposições coletivas e individuais em Portugal (Lisboa, Porto, Almada, etc.) e no estrangeiro (Nova Iorque, Barcelona, Salamanca, Paris, Roma, Estocolmo, Brasília, Rio de Janeiro, São Paulo, Madrid e Munique). Em Fevereiro de 1987 foi o artista do mês do Centro Cultural Português da Fundação Calouste Gulbenkian, em Paris, então dirigido por José-Augusto França.

 

A retrospetiva Quarenta Anos de Pintura foi concebida e apresentada em 1995, na Culturgest, e exibida em Serralves, no ano seguinte. Apresentou a sua última grande exposição na sede da Fundação Calouste Gulbenkian, comissariada por João Pinharanda, em 2007.

 

Está representado nas coleções dos ministérios, da Educação, da Cultura e dos Negócios Estrangeiros, no Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, na sociedade Nacional de Belas Artes, nos museus do Chiado, Serralves, Amarante, Tomar e nas coleções da Mobil, EDP, Caixa Geral de Depósitos, Millennium-BCP, BES, BPI, e BANIF. 

 

Da bibliografia publicada sobre a sua obra, destaque para o estudo de Eduardo Lourenço, Cruz-Filipe ou o tempo Imaginário (colóquio-Artes, 1975), para as monografias de Bernardo Pinto de Almeida (Lello & Irmão, 1994) e de Fátima Lambert (Caminho, 2006) e para o vídeo realizado no mesmo ano, por Álvaro Queiroz.

 

BICHOS, com textos de Mia Couto e Jorge Calado, é a publicação (edição Assírio & Alvim e patrocínio do Banco Português de Investimentos e da Caixa Geral de Depósitos), que contém as fotografias em que Cruz-Filipe fixa as imagens dos animais que, em completa liberdade, se lhe revelaram durante as quatro viagens realizadas em África, entre 1987 e 2005, parcialmente apresentadas nesta exposição.

 

Foi agraciado com o grau de Cavaleiro da Ordem de Mérito, pelo governo francês, e distinguido com: o Prémio Bolsa Malhoa, em 1965; o Prémio Nacional de Pintura da British Petroleum, em 1966; o Prémio Mobil, em 1971; o Prémio AICA, em 1995; e o Grande Prémio Banif de Pintura, em 2003.

 

 

 

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