Gestão de Cookies

Com o objetivo de melhorar os nossos serviços e a experiência de navegação, informamos que utilizamos cookies.

Aceitar

Recusar

Imagem da Capa: “Coração Burro” 2000

Julho – Setembro 2002

Ana Vidigal 10ª Exposição Galeria dos Paços do Concelho

Vinte anos de prática é quanto basta para ter sítio numa vida artística...

Vinte anos de prática é quanto basta para ter sítio numa vida artística, se tiver que o ter, por merecimento; mais vinte e terá lugar na própria história, acertado com o andamento dela, e da obra que o pintor continuar a fazer, com seriedade, empenho, teima, e o seu quê de ilusão e de obsessão.

São qualidades indispensáveis à história, quando a sensibilidade e a inteligência as são à obra — com a personalidade que dela saia, de dentro, e jamais a originalidade que para ela entre, de fora, por mera ideia de fazer diferente, se não tão “original” como as que a moda e circunstâncias ordenam, em tricas de crítica e preceitos de mercado, ou vice-versa, nos azares que a história da arte também acarreta. Mas, em mais ou menos breve, arruma e esquece, por pressa e pressão de outros, na moral imanente destas coisas...

Vinte anos leva a obra de Ana Vidigal, que obra já pode ser e é: a atenção do “Prémio Maluda” em 99 foi, então, mais do que incentivo, prémio de uma ação importante no seio da sua jovem geração, pela porta de uma consciência poética interior, em que o tempo de criação todos os dias conta, sem olhar para a vizinhança. E ser a mais nova pintora escolhida para a coleção do tema da “Carta de Pero Vaz de Caminha”, entre onze nomes todos eles ilustrados pela história, de mais de meio século alguns, é outra garantia do valor que lhe cabe — numa aposta que a crítica fez, para os lugares da história do tempo presente, entre já dois séculos.

Que faz, porém, Ana Vidigal como pintora? Dir-se-á que cola longas fitas de cor (e outros papéis) em superfícies de tela, como se sobre elas deslizasse pincéis embebidos e traçasse formas de geometria e fantasia. “Pintura é tudo o que se cola”, disse ela numa entrevista (1999), e é maneira de fazer que à pintura há muito convém e tem que convir, para além das marcas de tinta.

Jogam as formas numa espécie de às escondidas para revelarem silhuetas e frases que dizem o que digam, mas sempre no plano certo de um campo figurativo em que o espaço é razão de ser. Inevitável é isso, desde que pintura se fez, fosse qual tivesse sido a fatalidade da perspetiva, a duas, três ou “n” dimensões. A parede que a pintora nos propõe, com tudo quanto lá cole, é incontornável e inamovível — e ela sabe-o, ou pintora não seria... As dimensões que a sua pintura oferece ao espectador têm a multiplicidade do seu fascínio, irónico por temperamento de interrogar-se, humoroso por jeito voluntário de agredir. Assim é a personalidade psicológica de Ana Vidigal, e assim é a originalidade estética da sua pintura, sem lembranças que nela própria não nasçam pelo fazer permanente, ou, pelo menos, incansável. E não há pintura válida que assim não se (re) produza.

Junho, 2002  

José-Augusto França

 

 

 

O diário que cada um inventa para si é preenchido por acontecimentos e por descobertas que a mais ninguém pertencem. É como que uma imagem imaginária entre a importância do acontecimento, que se aguarda, e mil pequenas coisas que, por parecerem não ter importância, não é costume guardarem-se. Cada um tem uma ordem sua para guardar lembranças, folha a folha, e organizar em cada página um álbum pessoal das recordações assim imaginadas. E não raro as pequenas coisas vividas tomam nele as mesmas proporções das coisas grandiosas, que por isso mesmo se conhecem e, por isso mesmo, são faladas.

(...) Depois, porque qualquer destes quadros de Ana Vidigal, e no que à pintora diz respeito, é um acontecimento seu, e a íntima associação de tantas pequenas coisas que parecem não ter, em si mesmas, importância que se lhes dê, torna-se ela, a todas, igualmente importantes e significativas nesse acontecimento que é o seu quadro. E, ainda, porque há uma ordem só sua que, ao organizar o que principia por ser um discurso vivencial estruturando-se em discurso essencialmente pictórico, não destrói para alcançar este último, a porção de vivido e de imaginário trazida por cada pequena coisa ao ser integrada por essa ordem sua no plano do visível da pintura. Nada é verdadeiramente secreto nos seus quadros, nada há inscrito neles que se não veja e, contudo, há neles um segredo guardado que se furta às evidências.

(...) Como a cor dos seus quadros, como a caligrafia que desenha nas telas a passagem ondulante de versos não esquecidos, de restos de frases, palavras soltas, garatujas, sinaléticas gestuais, todo um alfabeto cruzado de discretas memórias e como que vindas ocasionalmente ao mundo da pintura. A tudo isto que é da sua mão, outras coisas a sua mão lhes junta: papéis e tecidos recortados, desenhos sem importância que valham a importância de guardá-los antes, folhas de modista, modelos de lavores com caprichosas iniciais de bordar trapos, a forma de um chinelo, plumas, flores de papel. Um bric-à-brac surpreendente de florilégios artesanais, que entroncam sem disfarce ou ênfase polémicos numa realidade popular revisitada.

(...) O pressentível fascínio destes quadros vem também muito do fluir dinâmico da linguagem variada que Ana Vidigal cria, em gosto e em prazer, e que tudo consegue incorporar e a tudo incorpora vitaliza, imagética e pictoricamente.

 

Abril, 1983 

Fernando de Azevedo

 

 

CATÁLOGO

 

1. Nebraska - 1996, colagem si papel (70x 100 cm)

2. Falo-lhe em Alhos, responde-me em Bugalhos - 1995, colagem si papel (70x 100 cm)

3. Célebres e Ricas - 1996, colagem si papel (70x 100 cm)

4. Ménage à Trois - 1995, colagem si papel (70x 100 cm)

5. Final Feliz - 1995, colagem si papel (70x 100 cm)

6. Branco e Amarelo - 1995, colagem si papel (70x 100 cm)

7. As Desgraças da vida são as Alegrias da Arte - 1995, colagem si papel (70x 100 cm)

8. The Entroubled Mmd - 1995, colagem si papel (70x100 cm)

9. Humility - 1995, colagem si papel (70x 100 cm)

10. PuIl - 1996, colagem si papel (70x100 cm)

11. AlI you can eat - 1996, colagem si papel (100x70 cm)

12. Sem qualquer pesar - 1995, colagem si papel (70x100 cm)

13. Califa - 2001, técnica mista si caixas de camisas (1 47x 158 cm)

14. Por favor, não te chames Victor Emanuel - n.d., técnica mista si caixas de camisas (125x150 cm)

15. A Menina dá licença? - 2001, técnica mista si papel (1 43x 162 cm)

16. Coração Burro - 2000, boneco de peluche ci plástico transparente (76x57 cm)

17. Sou uma pessoa pouco sociável - 2000, colagem si papel ci boneco de peluche (76x57 cm)

18. Aquela loura, Gerda, encostada a ele - 2000, colagem si papel (76x57 cm)

19.Sem título - 1982, colagem si papel (81 x92 cm)

20. Encosta-a ao meu - 2000, boneco de peluche, fita adesiva e acetato (76x57 cm)

21. Conclusão - 2000, boneco de peluche, fita adesiva e acetato (76x57 cm)

22. Falling from me - 2000, boneco de peluche, fita adesiva, polaroid e acetato (76x57 cm)

23. Pepsodent - n.d., boneco de peluche, fita adesiva e acetato (76x57 cm)

24. Errata - n.d., boneco de peluche, fita adesiva e acetato (76x57 cm)

25. Areias Movediças - 2000, colagem si papel, com boneco de peluche (76x57 cm)

 

A Câmara Municipal de Tomar agradece, à Galeria 111 e ao pintor Fernando Azevedo a sua indispensável colaboração.

 

 

 

O ARTISTA E A OBRA

Ana Vidigal nasceu em 1960 em Lisboa, onde vive e trabalha. Terminou em 1984 a Licenciatura em Pintura na Faculdade de Belas Artes de Lisboa e, entre 1985 e 87, foi bolseira da Fundação C. Gulbenkian. Em 1989 fez um estágio de gravura em metal com Bartolomeu Cid (Tavira), e foi pintora-residente no Museu de Arte Contemporânea do Funchal em 1998-99. Realizou a sua primeira exposição individual em 1981 na S. N. B. A. – Galeria de Arte Moderna, e desde o ano seguinte e até 1988 realizou sete exposições na Galeria Módulo, em Lisboa e Porto. Em 1990, 94, 96, 98, 99, 2001, 2002, expôs na Galeria 111 em Lisboa, em 1993 em Macau e em 1999 no Museu de Arte Contemporânea do Funchal, etc. A sua participação em exposições coletivas iniciou-se em 1981 e tem sido extremamente assídua, em Lisboa, Paris (Unesco), Madrid (Arco 85, 86, 87 e 99), Nova York, Basileia, Mónaco, Pequim, Rio de Janeiro (Museu de Arte Moderna), S. Paulo (Museu de Arte), Cagnes-sur-mer (Festivais Internacionais), Caldas da Rainha, V. N. Cerveira, Santa Maria da Feira, Chaves, Faro, etc. No Funchal realizou uma instalação em 2000.

Em 1999 foi selecionada pela AICA – Association International des Critiques d`Art para integrar a coleção de pinturas de onze artistas oferecidas ao Brasil, tratando o tema “A Carta de Pero Vaz de Caminha” (apresentação de J. A. França). Nesse ano também recebeu o Prémio Maluda para jovens pintores, então instituído, com o maior valor monetário atribuído em Portugal. Obteve outros prémios na III Bienal de V. N. Cerveira (1982), I Exposição Banco Fomento Nacional (1984), Arte Jovem (Maia, 1995) e menções honrosas no Festival Internacional de Cagnes-sur-mer (1985), concurso Vila Simões (1987), Encontro Arte Jovem (Chaves, 1992), VI Bienal Caldas da Rainha (1995).

Em 1995 foi convidada pelo Metropolitano de Lisboa para a execução de um painel de azulejos para a estação de Alvalade e em 1998 teve um CD-ROM editado pelo Instituto de Arte Contemporânea do Ministério da Cultura. Está representada em numerosas coleções privadas e públicas como o Museu de Arte Moderna, Serralves, Porto, Museu de Arte Contemporânea, Funchal, Museu Martins Correia, Golegã, Museu A. Teixeira Lopes, Mirandela, Câmaras Municipais de V. N. Cerveira, Chaves, Maia, Tomar. E ainda nas coleções dos Bancos de Portugal, Fomento Nacional, Comércio e Indústria, Português do Atlântico e Caixa Geral de Depósitos, etc. 

Gosta deste tópico?
Deixe um comentário

Partilhar esta página

Conhecer o(s) artista(s)